6.9.10

Matéria/Tarot

Por Carlos Nishimiya

 

Este projeto “Tarot”, do totalmente desconhecido Walter Wegmüller, é um dos maiores discos lançados da época de ouro do krautrock. Walter era, na verdade, um grande pintor e artista plástico suíço, místico, figura carimbada e agent provocateur, mas sem nenhuma experiência anterior ou posterior com música. Walter era amigo de Timothy Leary, do poeta Sergius Golowin e do influente artista plástico H.R. Giger (famoso pelo visual do filme “Alien”).

Aparentemente foi o guru do LSD Timothy Leary quem teve a idéia de sugerir a Walter fazer um disco conceitual, baseado nos desenhos num set de cartas de tarô que Walter fez entre os anos de 1968 e 1973.

“Tarot” saiu em 1973 pelo selo Die Kosmischen Kuriere em LP duplo, numa embalagem elaboradíssima, com um encarte com as 22 cartas dos arcanos maiores e mais 12 outros encartes menores com fotos dos músicos e outras informações.

Os músicos que acompanham Walter Wegmüller nesta jornada mística e espiritual é um verdadeiro who’s who do rock alemão. Coletivamente eram conhecidos como The Cosmic Jokers e lançavam seus discos pelo selo Die Kosmische Musik, um sub-selo criado por Rolf-Ulrich Kaiser, dono do famoso selo Ohr, na época uma das maiores gravadoras underground alemãs.

Dentre os músicos estavam: Harald Grosskopf (bateria), Jerry Berkers (baixo, guitarra) e Jürgen Dollase (teclados, especialmente piano), todos do Wallenstein; Manuel Göttsching (guitarra, também do Ash Ra Tempel), Walter Westrupp (metade do duo Witthüser & Westrupp), Harmut Enke (guitarra, baixo, Ash Ra Tempel), Klaus Schulze (teclados, ex-Tangerine Dream, Ash Ra Tempel e muito mais famoso depois pela sua carreira solo).
Todos esses super músicos foram reunidos em jam sessions por Rolf-Ulrich Kaiser, que gravava tudo que eles tocavam, sessões estas regadas a muito ácido e outros alteradores da consciência.

Walter Wegmüller canta, ou melhor declama seus textos (em alemão) por cima das improvisações, que são espetaculares, estilisticamente variando de canções com toques folk, climas eletrônicos, acid rock freak-outs, mantras orientais, uma explosão de criatividade não esperada de músicos chapados (ou não).

Mas Walter é o guia aqui, nos levando por uma jornada que passa por cada uma das cartas do tarô, abrindo o disco com a faixa de número 0 (bizarramente o disco traz as faixas numeradas a partir do zero), “Derr Narr”, que traz uma apresentação (em inglês) de cada um dos músicos.

As letras em alemão não importam muito para degustar o disco. Existe uma história no encarte que explica por cima do que se trata, mas o que realmente importa em “Tarot” é a música.

Em seguida “Der Magier” (o Mágico) traz o som característico do Tangerine Dream e Klaus Schulze, com uma avalanche de sons eletrônicos, principalmente mellotron e sintetizadores guiado pelo drive da cozinha de baixo e bateria do Wallenstein.

As outras estrelas no disco são, sem dúvida, Manoel Göttsching, com seus soberbos solos de guitarra e também Klaus Schulze, que está sempre presente tanto com seus climas ao Mellotron como com os estridentes sons dos seus sintetizadores. Não existe crédito individual de composição nas faixas. São todas creditadas a todos os envolvidos, mas é claro pela audição que alguns foram muito mais responsáveis que outros, Klaus e Manoel, entre eles.

Algumas das minhas faixas favoritas são “Die Prüfung”, que abre o segundo CD, com uma sonoridade tão moderna que poderia ser o trabalho de uma banda como o Stereolab. A parte percussiva parece um beat de bateria eletrônica, fazendo uma base perfeita para as viagens sonoras, repletas de efeitos, providenciadas por Klaus Schulze.

“Der Teufel”, com seus dois violões quase flamencos e solo de flauta, trazem um clima totalmente diferente, quase mediterrâneo.
“Die Zersörung” traz um tema quase erudito executado ao piano. Outros instrumentos se unem, um mellotron, cello, até que uma avalanche de ruídos e guitarras distorcidas trazem o tema ao seu fim.

A guitarra de Manoel Göttsching domina “Der Hohepriester” com seus solos ácidos. Quase vale pelo disco todo.

Os primeiros três lados do LP (ou seja, o primeiro CD e as primeiras cinco faixas do segundo CD) tem faixas bem distintas e separadas. O que seria o quarto lado do LP (as últimas cinco faixas do CD) são uma única suíte contínua, que lembra muito o trabalho de Manoel Göttsching e seu Ash Ra Tempel.

Inclusive o disco “Join Inn” do Ash Ra Tempel foi gravado por Göttsching, Klaus Schulze, Hartmut Enke (baixo) e Rosi Müller (vocais, convidada especial) durante as sessões para “Tarot”, enquanto os outros músicos não chegavam ao estúdio!

Rolf-Ulrich Kaiser fez uso extensivo das gravações que os Cosmic Jokers fizeram, aproveitando o máximo do que foi gravado, usando esse material para lançar três discos sem o conhecimento da própria banda.

A história completa do Cosmic Jokers e de Rolf-Ulrich Kaiser, etc. vale uma coluna no futuro.

Fiquemos aqui com o inesquecível disco que Wegmüller e esse incrível grupo de sessionmen alemães fizeram em 1973. Um marco do krautrock e um item indispensável para quem é fã do estilo.

Manuel Göttsching - guitarra
Hartmut Enke - guitarra
Jerry Berkers - baixo
Jürgen Dollase - teclado
Walter Westrupp , Klaus Schulze, Harald Großkopf - bateria


Lista de músicas :
Disco 1 ( 43:26 )
1. Der Narr (3:55)
2. Der Magier ( 04:38 )
3. Die Hohepriesterin (4:17)
4. Die Herrscherin ( 04:16 )
5. Der Herrscher ( 02:58 )
6. Der Hohepriester (3:10)
7. Die Entscheidung ( 03:51 )
8. Der Wagen (5:15)
9. Die Gerechtigkeit ( 03:01 )
10. Der Weise ( 04:01 )
11. Das Glucksrad (3:38)
12. Die Kraft ( 03:26 )


Disco 2 ( 41:34 )
13. Die Prüfung ( 04:56 )
14. Der Tod ( 01:19 )
15. Die Ma ? igkeit ( 04:47 )
16. Der Teufel (3:38)
17. Die Zerstörung ( 04:00 )
18. Die Sterne ( 06:14 )
19. Der Mond ( 02:50 )
20. Die Sonne ( 03:03 )
21. Das Gericht ( 02:06 )
22. Die Welt ( 08:41 )

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Matéria original em>> portalrockpress

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