24.5.10

Flying_Lotus-Cosmogramma-2010

 

Flying lotus

Disco: Cosmogramma (2010)

Odisseia cósmica a bordo de um shuttle que percorre a órbita da música negra, a velocidade warp, rumo ao mesmíssimo local de partida.

Convidado para o Sónar 2008 por Mary Anne Hobbs (autora do programa “Dubstep Warz” da BBC Radio 1, dedicado ao dubstep, e considerada como uma das mais referenciais divulgadoras deste género nascido no sul de Londres, na senda do pioneiro e ex-colega John Peel), Flying Lotus (nome de guerra para Steven Ellison) actuou na mesma noite de Shackleton, Mala, entre outros projectos mais ou menos emergentes da cena dubstep. Terminada a sua vibrante sessão, deixou-se ficar no palco, minando a actuação de dois miúdos que se seguiram, intrometendo-se com samples e loops oriundos do seu equipamento, em constante sobreposição, resultando num espectáculo bizarro, sofrível, ininteligível, até ao nascer do dia. Numa palavra: caos. E não é só em palco, ou sob o efeito de opiáceos, pois Los Angeles (2008) padecia da mesma desordem rítmica, com beats quebrados e dessincronizados, sons desfasados, texturas alienígenas e demais apontamentos não-convencionais, conjugando o hip-hop, o dubstep e o broken beat com várias outras linguagens urbanas, num disco tão estranho e inclassificável quanto experimental e, na medida do impossível, original.
Novamente pela Warp de Chris Clark, o agente do caos volta à carga com a edição de um seu terceiro longa-duração, intitulado Cosmogramma (2010). Um caos que, revela-se-nos agora, parece obedecer a um sentido superior de harmonização cosmológica. Toda aquela desordem rítmica e sonora, com faixas que vão terminando umas por cima das outras, resulta num todo incoerente mas funcional, ora como que a possibilidade da existência de vida por debaixo de uma superfície absolutamente inóspita, num qualquer astro distante. O dubstep londrino não passou, afinal, de um equívoco episódico, rótulo tornado obsoleto. Ellison é californiano, tem como tia-avó a mítica Alice Coltrane e é admirador incondicional de J Dilla.
Este novo disco é um caldeirão onde se misturam diversos ingredientes: cultura de videogames, hip-hop de cariz old school, grooves electrónicos, atonalidades jazzísticas, etc. A incerta altura ouvimos uma linha de baixo dedilhada à Pat Metheny que, embrenhada em toda uma parafernália de loops e sintetizadores, remete para a reminiscência dos Headhunters de Herbie Hancock. Precisam de mais um rótulo, mais um neologismo? Talvez digital-jazz, ou a ressurreição de Sun Ra na narrativa de um jogo de computador, pilhando tudo à sua volta. Em duas palavras: caos e pilhagem. Pressente-se que Flying Lotus quer conquistar o mundo, só não descobriu (ainda) a melhor farsa para o fazer.

Gustavo Sampaio
gsampaio@hotmail.com

Texto encontrado em> Bodyspace

Para ouvidos entorpecidos por: Alice Coltrane, Cosmic jokers, Four Tet.

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